* Texto publicado no Medium.
A criatividade tem se tornado um tema que vem recebendo muita atenção das empresas e da academia nos últimos anos. Duas explicações ajudam a entender essa tendência.
A primeira é o rápido desenvolvimento da inteligência artificial que tem ocupado e ocupará o espaço de trabalho das pessoas na realização de atividades mais rotineiras. Como a criatividade é uma característica essencialmente humana, tarefas que envolvam o seu uso de maneira intensa dificilmente serão substituídas por máquinas. Pelo menos não de imediato. Por isso, habilidades relacionadas ao pensamento criativo ganham proeminência no ambiente de trabalho.
A segunda explicação é a preocupação cada vez maior das empresas, governos e da sociedade em geral com a criação de soluções inovadoras para os problemas atuais. Como a inovação é uma consequência da criatividade, isso significa que soluções inovadoras, obrigatoriamente, passam pelo processo criativo. A criatividade, portanto, se apresenta como um caminho possível para superar esses desafios.
No entanto, ainda prevalece no imaginário popular a ideia de que a criatividade é um dom que as pessoas possuem e com a qual apenas alguns privilegiados tiveram a sorte de nascer. Esse pensamento ajuda pouco a resolver os problemas que estão postos atualmente e a superar os desafios mencionados, porque ele assume que essa tarefa só poderá ser desempenhada por um seleto grupo de gênios criativos.
Felizmente, a criatividade não se resume apenas a capacidade cognitiva de pessoas talentosas. Para um entendimento mais abrangente de como ela funciona e do seu poder no processo de inovação, os 4 P’s da criatividade são bastante esclarecedores. Eles foram originalmente propostos por James Rhodes na década de 1960 e são formados por: pessoa, processo, ambiente (do inglês press) e produto.
Pessoa
O primeiro “P” da criatividade diz respeito aos traços de personalidade, valores, hábitos e atitudes de um indivíduo que potencializam o seu poder criativo. Pessoas que são consideradas criativas tendem a apresentar características como fluência de ideias, flexibilidade cognitiva e pensamento divergente. Elas também são capazes de redefinir objetos e conceitos familiares, aplicando neles um olhar de estranhamento. Uma característica marcante de pessoas criativas é sua capacidade de observação. Elas são curiosas, questionadoras e estão sempre atentas aos detalhes que passam desapercebidos pela maioria das pessoas.
Pessoas criativas também são confiantes, possuem habilidade de concentração e lidam bem com conflitos, tensões e ambiguidades. Elas estão sempre se reinventando no sentido de abrir mão de suas certezas e verdades absolutas. Em geral, são essas as pessoas mais habilitadas para dar início a algum tipo de inovação, pois elas possuem grande capacidade e criar algo novo e útil. Como mencionado anteriormente, a criatividade não é um dom ou um talento com o qual a pessoa nasce. Ela é sim uma habilidade que pode ser aprendida e aperfeiçoada ao longo do tempo com treinamento e exercícios. Isso nos leva ao segundo “P”: processo criativo.
Processo
O processo criativo refere-se à um conjunto de etapas e atividades organizadas para a resolução de problemas. Esse processo abrange aplicação do pensamento convergente e divergente, aprendizagem com os erros cometidos e um ciclo de feedback que ajuda aperfeiçoar a ideia criativa. Muitos processos criativos têm se difundido nos últimos anos. O design thinking, desenvolvido pela a empresa de design IDEO, talvez seja um dos mais populares atualmente. Ele tem sido muito usado por várias organizações ao redor do mundo para criar produtos e serviços inovadores. Utilizado pela Google para testar novas ideias, o design sprint também tem ganhado bastante atenção pelo seu rápido processo de geração e experimentação de soluções que leva apenas cinco dias. Outros métodos são o pensamento lateral, analogias e metáforas.
Apesar da existência de diversos métodos, de um modo geral, um processo criativo é dividido em quatro etapas: preparação, incubação, inspiração e verificação. A preparação consiste na coleta de informações sobre o problema que se pretende resolver. A incubação envolve o estabelecimento de relações entre as informações levantadas. A inspiração diz respeito ao surgimento das ideias que resolvem o problema em questão. Por fim, na verificação busca-se uma convergência de ideias para a identificação de uma solução final. Embora esse processo nem sempre ocorra de maneira deliberada e linear, ele é crucial para o desenvolvimento de qualquer inovação. Processos criativos são mais efetivos em ambientes de trabalho que favorecem a criatividade. Assim, o terceiro “P” entra em ação.
Ambiente (Press)
O ambiente refere-se ao meio social em que a pessoa está inserida e o seu relacionamento estabelecido com ele. As pessoas criam ideias a partir de respostas a um conjunto de necessidades, sensações, percepções e imaginações que são despertadas dentro de um determinado contexto (uma organização ou uma equipe de trabalho). O ambiente pode ser tanto um catalizador quanto um inibidor da criatividade. Ele afeta diretamente a performance criativa individual e das equipes.
Se seu chefe lhe confere autonomia, disponibiliza os recursos necessário para a realização das suas atividades e apoia suas tentativas de criar algo novo, o ambiente de trabalho funcionará como um catalizador da sua criatividade. Mas se o seu chefe é centralizador, se as tentativas malsucedidas da equipe em criar algo novo são acompanhadas de algum tipo de punição e se a relação entre os colegas de trabalho é tóxica, o ambiente acaba operando como um inibidor da criatividade. No primeiro caso são altas as chances de uma solução inovadora surgir. Já no segundo, a solução será protocolar e pouco útil para a empresa. Por isso, o produto inovador depende muito do ambiente dentro do qual ele é gestado. Isso nos leva para o quarto “P”.
Produto
O produto representa a tangibilização de uma ideia que surge como resposta a um problema específico. Para as empresas, a criatividade não teria muito sentido se não for possível traduzi-la em algo concreto, como um produto ou serviço. Assim, quando a implementação de uma ideia criativa é bem-sucedida, temos uma inovação.
Um produto criativo tem valor no seu contexto histórico de criação e, em geral, rompe com padrões já estabelecidos, criando novos mercados ou modificando o comportamento dos cidadãos ou consumidores. Por exemplo, a transformação digital dos governos por meio do uso de tecnologias tem transformado e melhorado a relação entre o cidadão e o Estado.
Conectando os 4 P’s
Os 4 P’s da criatividade nos dão uma boa dimensão do que ela envolve, especialmente por estarem relacionados. Um produto tem maiores chances de ser criativo quando resultante de um processo de geração de ideias dentro de um ambiente favorável a criatividade que potencialize as habilidades e o poder de criação das pessoas nas suas atividades, fazendo assim emergir a inovação.
Referências
AMABILE, T. M. (1998). How to Kill Creativity. Harvard Business Review. September-October, p. 77–87.
RHODES, M. (1961). An Analysis of Creativity. Phi Delta Kappan, Vol.42, №7, p. 305–310.
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